Ponte para a vida
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Depois de 22 meses, o
filhote nasceu. Acomodado no campo
aberto da savana, recebeu o primeiro
carinho da mãe que o livrou da placenta,
observou os primeiros movimentos e ficou
à espera.
Como todos os elefantes recém-nascidos,
este filhote deveria erguer-se e dar os
primeiros passos quase imediatamente.
Não foi, porém, o que aconteceu. Com
esforço ele apoiou-se nas pernas
traseiras e ergueu parte de corpo, mas
as patas dianteiras não obedeceram e
continuaram dobradas. Ele ficou de
bruços e com penoso esforço arrastava-se
para acompanhar a mãe.
O que fazer? Relutante, a família seguiu
em marcha lenta, em busca de água e
alimento, deixando mãe e filho para
trás, com quem continuaram se
comunicando com formidáveis sons
guturais audíveis a mais de um
quilômetro.
A terapia de mamãe elefante entrou em
ação imediatamente. Horas e horas
seguidas ela repetiu o exercício de
erguer o filho com a tromba e ajudá-lo a
ficar em pé. Finalmente o bebê ganhou
força e equilíbrio e andou com a mãe em
direção à vida.
Eu estava emocionado com as cenas
daquele documentário na televisão.
Lembrei-me de mães que abandonam
recém-nascidos à própria sorte à porta
de desconhecidos ou em locais destinados
ao lixo. E lembrei-me, também, de penoso
pedaço de minha história pessoal.
Vítima de osteomielite aos doze anos,
fui dado como caso perdido pelos médicos
naquele hospital nos confins do Rio
Grande do Sul. Levado para casa, vivi
meses que me pareciam tenebrosa
eternidade no vale da morte. Mas
sobrevivi.
Ao sair das sombras para a vida, trazia
duas heranças que me acompanhariam para
sempre: as seqüelas físicas permanentes
e o milagre do amor de meu pai que me
ensinou a coragem de andar e de viver
novamente. Foram meses de progressos
miudinhos e seguros que sempre mereciam
dele palmas e sorrisos encorajadores.
Suas fortes mãos de carpinteiro foram
meus instrumentos de exercício todos
aqueles dias. Seu amor, foi a ponte para
a vida em todos os momentos.
Sei que os reais motivos que levam à
escolha profissional podem ser um
desafio para muitos pesquisadores, mas
não para mim. Escolhi comunicação e,
nesta, o caminho da saúde e da harmonia
de vida de que tantos necessitam. Os
valores que a vida me confiou me foram
grandes demais para serem devolvidos de
outra forma.
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